Lição 1 – Adão, o Primeiro Homem
1º Trimestre de 2020
ESBOÇO GERAL
I – A DOUTRINA BÍBLICA DO HOMEM
II – A CRIAÇÃO DOS CÉUS E DA TERRA
III – A CRIAÇÃO DE ADÃO, O PRIMEIRO SER HUMANO
IV – A MISSÃO E A TAREFA DO HOMEM
A DOUTRINA BÍBLICA DO HOMEM
Claudionor de Andrade
Quando comecei a estudar teologia sistemática, não imaginava que essa ciência pudesse ser tão prática e devocional. Em meus 17 anos, considerava-a uma disciplina, cuja finalidade era apenas periférica: ornar-me o intelecto e a oratória. Decorridos todos esses anos, passei a vê-la não como um lustre, mas como um exercício espiritual. Quando biblicamente alicerçada, leva-nos a magnificar o nome de Deus e a exaltá-lo como o Criador e Mantenedor de todas as coisas.
Neste tópico, veremos por que a doutrina do homem constrange-nos a amar a Deus e ao próximo. A fim de a conhecermos com mais propriedade, teremos de defini-la, estabelecer-lhe o lugar no escorço da teologia sistemática, observar-lhe os fundamentos e delinear-lhe os principais objetivos.
1. Definição. A doutrina bíblica do homem é o ensino sistemático das verdades referentes ao ser humano encontradas nas Escrituras do Antigo e do Novo Testamentos. Essa disciplina tem como objetivo estabelecer o lugar do homem na criação terrena e no Reino dos Céus.
No âmbito da Teologia Sistemática, a doutrina bíblica do homem é conhecida como antropologia — uma palavra técnica formada por dois vocábulos gregos: antropos, homem e logia, estudo ou discurso racional.
2. O lugar da antropologia na teologia sistemática. O verdadeiro teólogo jamais colocará o homem acima de Deus, pois conhece experimental e pessoalmente o Criador, e não ignora os limites da criatura. Logo, a genuína antropologia bíblica virá sempre depois da teologia em si: a reflexão acerca do Ser de Deus.
Na seara do labor teológico, a antropologia tem de ser bíblica e teológica, porquanto o homem foi criado por Deus e pertence a Deus (Ez 18.4). Todavia, a teologia propriamente dita jamais será antropológica. Os que assim a lavram incorrem na blasfêmia tão comum aos poetas gregos e romanos, que, em seus versos, exaltavam a criatura em detrimento do Criador (Rm 1.25).
Se a teologia sistemática tiver, como capítulo inicial, a antropologia e fizer da antropologia o fundamento de suas reflexões, na verdade, não será teologia, apesar de seu escopo e aparência. Teremos aí uma mera e blasfema antropologia filosófica, posto que o seu autor, ao elaborá-la, não tinha como foco o Ser de Deus — a Teontologia. Quando isso ocorre, não surge apenas uma antropologia filosófica, mas uma teologia liberalizante e antibíblica, que, canonizando o homem como a medida de todas as coisas, profana o nome do Deus Único e Verdadeiro.
Atualmente, alguns esquerdistas católicos, a fim de tornar a Teologia da Libertação mais palatável às Américas Central e do Sul, já começam a dar-lhe um nome que não lembra Marx ou Lênin, mas nem por isso deixa de ser marxista e leninista. Refiro-me à Teologia Ecológica. Condoendo-se das matas e dos bichos, esse arremedo teológico ignora, na prática, os órfãos, as viúvas e os desamparados.
A verdadeira teologia bíblica não é apenas sistemática; é imperativamente orgânica: tem de começar com Deus, o Ser Supremo por excelência, e há de encerrar-se com a manifestação do Reino, que o Pai Celeste vem preparando-nos desde a mais remota eternidade. Em seu escorço, o homem é apenas um servo; a primazia é toda de Deus em Jesus Cristo.
3. Fundamentos. O principal fundamento da doutrina bíblica do homem encontra-se, obviamente, na Bíblia Sagrada. Inspirados pelo Espírito Santo, os profetas e apóstolos apresentam, com autoridade e clareza, a real hierarquia dos seres. Em primeiro lugar, Deus, o Criador e Mantenedor de todas as coisas. Logo em seguida, aparecem os santos anjos e o ser humano — as criaturas racionais, cuja missão é amar e servir ao Senhor com todo o entendimento.
Além da Bíblia Sagrada, temos como fontes auxiliares o nosso Credo, a Declaração de fé da Assembleia de Deus no Brasil e os livros-texto referendados por nossas autoridades eclesiásticas.
Não nos esqueçamos de que a teologia, para ser válida, tem de ser trabalhada no âmbito da Igreja de Cristo. Quando urdida nas academias, sem a supervisão do Santo Ministério, corre o risco de fazer-se herege e apóstata. A experiência eclesiástica mostra que os apóstolos, profetas, evangelistas, pastores e mestres, constituídos pelo Espírito Santo, são a garantia da biblicidade e pureza de nossa doutrina (Ef 4.11-14).
4. Objetivos. A teologia sistemática não é um fim em si mesma; não pode limitar-se ao gabinete pastoral, nem deve ser encerrada nos limites estreitos e ditatoriais da academia. A verdadeira teologia bíblica, quer sistematizada quer por sistematizar-se, há de gerar almas e serviços ao Reino de Deus. Se não o fizer, assemelhar-se-á às múmias que vi no Museu do Cairo. Apesar de encerradas em preciosos sarcófagos, não têm vida; podem ser até admiráveis, como de fato o são, mas nunca lograrão conduzir o pecador, já arrependido, ao Céu.
A antropologia bíblica mostra a sua real utilidade, ao responder às perguntas que boa parte dos seres humanos ainda faz, por ignorar a Palavra de Deus. Daqui a pouco, trataremos dessas indagações. Você e eu, querido leitor, mui provavelmente já as fizemos nalgum período de nossa vida. Hoje, na condição de ministros do Senhor, não podemos agir como a Esfinge descrita por Sófocles (497-405 a.C.). Temos de responder, sempre com base na Bíblia Sagrada, as indagações que nos são encaminhadas todos os dias.
Com sua cabeça de mulher e corpo de leão, a Esfinge afligia os moradores de Tebas, propondo-lhes um enigma complicado e mortífero: “Que animal anda pela manhã sobre quatro patas, a tarde sobre duas e a noite sobre três?”. Segundo a lenda, muita gente foi devorada pelo monstro. O quebra-cabeça só viria a ser elucidado por Édipo, filho de Laio, rei de Tebas, que, desafiado pela esfinge, respondeu-lhe que o ser humano era o animal em questão. Afinal, o homem, quando bebê, engatinha; no ápice da força, caminha ereto; mas, ao envelhecer, apoia-se numa bengala para ir e vir. Ao invés de ser devorado, Édipo forçou o monstro a precipitar-se num abismo.
Em minha estada no Egito, já nas bordas de Gizé, deparei-me com uma colossal estátua semelhante à de Sófocles. Esta não tinha cabeça de mulher; trazia a carranca do faraó que lhe custeara o fabrico. Suas feições, conquanto mudas, eram cheias de ruindades e indiferenças; o nariz quebrado aumentava-lhe a ferocidade da catadura. Pelo jeito com que os turistas olhavam-na, tive a impressão de que ela repetia a mesma pergunta de sua congênere de Tebas.
A esfinge de Sófocles, ao propor o enigma aos habitantes de Tebas, era teológica ou antropológica? A questão era, sem dúvida alguma, antropológica: descrevia admiravelmente a peregrinação do ser humano na terra dos viventes. Mas, ao formulá-la, não era nem teológica nem antropológica, mas zoológica, pois não via, na criatura humana, a imagem e a semelhança de Deus. Aos seus olhos, o Criador e o homem não passavam de meros animais — o segundo cópia do primeiro; ambos descartáveis e prontos a ser devorados pela incredulidade. Não foi o que Paulo escreveu aos romanos? Atentemos às palavras do apóstolo:
Porque os atributos invisíveis de Deus, assim o seu eterno poder, como também a sua própria divindade, claramente se reconhecem, desde o princípio do mundo, sendo percebidos por meio das coisas que foram criadas. Tais homens são, por isso, indesculpáveis; porquanto, tendo conhecimento de Deus, não o glorificaram como Deus, nem lhe deram graças; antes, se tornaram nulos em seus próprios raciocínios, obscurecendo-se-lhes o coração insensato. Inculcando-se por sábios, tornaram-se loucos e mudaram a glória do Deus incorruptível em semelhança da imagem de homem corruptível, bem como de aves, quadrúpedes e répteis. (Rm 1.20-23, ARA)
A esfinge de Sófocles é o fiel retrato de alguns teólogos que andejam por nossos arraiais. Em seus livros, apostilas e sermões, ao invés de proclamar a mensagem da cruz, arvoram-se como a Esfinge de Tebas. São altivos e soberbos, e propõem os mais loucos enigmas ao povo de Deus. Exibindo um hebraico que não possuem e ostentando um grego que não conhecem, assombram a congregação, alegando que só podem entrar nos arcanos divinos os que conhecem os profetas e os apóstolos no original. Assemelham-se eles aos gnósticos, que, mentindo, ensinavam estar o conhecimento divino limitado a uma elite privilegiada. E, dessa forma, desconstruindo a Palavra de Deus, afastam os santos dos Céus e lançam, no lago de fogo, os que anseiam pela salvação em Jesus Cristo. O Filho de Deus, porém, no auge de seu ministério terreno, enalteceu o Pai por revelar os mistérios da salvação aos simples e pequeninos: “Graças te dou, ó Pai, Senhor do céu e da terra, porque ocultaste estas coisas aos sábios e instruídos e as revelaste aos pequeninos” (Mt 11.25).
O objetivo da antropologia, genuinamente bíblica, não é propor enigmas, mas responder às perguntas que o ser humano, desde a sua expulsão do Éden, não cessa de formular: Quem sou eu? De onde vim? O que represento? Qual a minha missão? E para onde vou? Existe realmente um Ser Supremo a quem devo prestar contas de meus atos?
Além disso, a antropologia bíblica mostra a dependência do homem em relação a Deus, o Criador e Mantenedor de todas as coisas. Sempre com base nos profetas e apóstolos, ela testifica que o ser humano jamais foi um fim em si mesmo. Fomos criados por Deus e postos neste mundo, para administrá-lo de conformidade com as leis e diretrizes que o Senhor nos deixou em sua Palavra — a Bíblia Sagrada. Fomos criados por Deus e para Deus.
Quando nos aprofundamos na antropologia Bíblica, conscientizamo-nos de que ela é amorosamente redentora. Seu principal objetivo é conduzir-nos à plena comunhão com o Pai Celeste por intemédio de Jesus Cristo, o Homem Perfeito.
Finalmente, a verdadeira antropologia bíblica apresenta-se como um instrumento didático, por meio do qual o Espírito Santo consola-nos quanto ao nosso destino eterno. Somos redimidos pelo sangue de Jesus Cristo. E, hoje, já na condição de filhos de Deus, temos acesso ao trono da graça. Agora, querido irmão, somos coerdeiros dos santos do Antigo e do Novo Testamentos. Nessa condição, somos vistos por Deus como santos e justos; apesar de sermos ainda imperfeitos, somos recebidos, por Ele, como seus filhos amados.
Texto extraído da obra “A Raça Humana: Origem, Queda e Redenção”, editada pela CPAD.
Fonte: Portal da Escola Dominical